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É tão ridícula como verdadeira a seguinte afirmação: eu não consegui ler em mais em Outubro por causa de um gato que gosta de se colocar entre mim e o livro e/ou morder páginas.
Ainda assim, li, embora muito menos.
Como referi anteriormente, estou a reler o Novas Cartas Portuguesas de Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, na edição organizada e anota por Ana Luísa Amaral.
O fantasma dos Canterville e outros contos, Oscar Wilde
#lerosclássicos2021 - horror ou gótico #estaçõesliterárias - autor LGBT+
É uma leitura que é também uma releitura porque já conhecia alguns dos contos.
Vou falar apenas do conto o O fantasma dos Canterville, de Oscar Wilde já que estamos em Outubro.
Imaginem uma pragmática família americana, num castelo assombrado inglês. O resultado é hilariante, como só Oscar Wilde nos poderia dar.
Wilde tece aqui uma apurada crítica à sociedade vitoriana, entretida com a popularidade do espiritismo, na forma de sessões espíritas.
A duke by Scot - Amy Jarecki NetGalley
#estaçõesliterárias - Um livro do teu género favorito
Lady Julia St. Vincent não tem escolha a não ser se vestir de homem e aceitar o cargo de mordomo do duque de Dunscaby.
Este romance tenta continuar o cliché do casamento com duques rebeldes, mas querendo dar resposta ao feminismo, com uma personagem feminina empreendedora que, apesar de lady, também trabalha para poder sustentar o pai endividado e doente.
O resultado é, todavia, inverosímil porque nem com muita benevolência consegui acreditar que este homem não seria capaz de perceber que a mulher e homem, sem qualquer disfarce, eram a mesma pessoa.
O professor, Charlotte Brontë
#estaçõesliterárias - Um livro em que haja uma dinâmica escolar
#victober
William Crimsworth é um jovem inglês, órfão, que decide renunciar a todas as ajudas que poderia ter para subir na vida ou manter-se estável, tentando por si mesmo alcançar os seus objetivos e interesses...
E é muito chato. E não, ele não renuncia a todas as ajudas. Aliás, é com ajudas que irá obter empregos. Mas enfim...
Este é o primeiro romance de Charlotte Brontë onde se sente, numa jovem costureira, o embrião do que virá a ser Jane Eyre.
O estranho caso da velha curiosa, Agatha Christie
#IYGIRI2021:
Se tens, lê um livro que tenha sido escolhido da estante por outra pessoa (ou seja, a sobrinha mais nova)
Palavras para quê?
É Agatha Christie e, ao contrário do habitual, não foi Poirot, mas Miss Marple.
Dois comboios cruzam-se breve e lentamente às 16:50. Uma senhora idosa, acorda para se deparar com uma cena horrível: pela janela da sua carruagem, vê que na carruagem do outro comboio, uma jovem mulher está a ser estrangulada.
Terá sido real ou um sonho? A verdade é que ninguém acredita nela e o facto de não aparecer nenhum cadáver, não ajuda nada.
O resto é Agatha Christie no seu melhor.
“a book about people trying to solve problems caused by people trying to solve problems”
Elizabeth Kolber maravilhou-me com o seu SEXTA EXTINÇÃO (vencedor de um Pulitzer) e arrasou-me com o seu UNDER A WHITE SKY: THE NATURE OF THE FUTURE.
Este livro é, para mim, de leitura obrigatória.
Embora com momentos algo morosos nas descrições, Elizabeth Kolber mostra como várias intervenções humanas, que procuravam resolver problemas, se revelaram profundamente desastrosas.
O livro fala sobre a introdução da carpa asiática num ecossistema, com o propósito de controlar plantas aquáticas tóxicas. Uma solução "ecológica", impulsionada pela obra de excelência da protecção ambiental: Silent Spring de Rachel Carson, que gerou um movimento contra a utilização excessiva de pesticidas, nos anos 60.
O problema é que a carpa asiática não tem predadores na zona dos grandes lagos da América do Norte (e já agora, em Portugal) e como tal, tornou-se uma espécie invasora e destruidora de habitats pela forma como comem e se de reproduzem. Agora, os humanos procuram formas de controlar as carpas.
Saltando das carpas para os sapos e ratos, para explicar o conceito (para mim fascinante) de manipulação de genes dominantes. Sabem aquelas aulas de ciência em que aprendemos que o tipo A ou B são dominantes em relação ao tipo sanguíneo O?
Pois bem, já é possível manipular esses genes dominantes. Por exemplo, introduzindo no ecossistema ratos que só reproduzissem machos. Cada nova geração teria esse gene dominante e continuaria a apenas produzir machos, até à extinção da espécie.
Outro exemplo utilizado são os diques de Nova Orleães e o desastre provocado pelo furacão Katrina. No final, ficamos com a clara sensação da irracionalidade que é criar novos diques, gastando muito mais do que seria gasto a realojar pessoas. Porque continuar a lutar por ocupar espaço da natureza?
Um exemplo clássico que evidencia como os mais pobres são os primeiros a pagar os custos ambientais, é a Isle de Saint Charles, que está a desaparecer devido a intervenção humana, nomeadamente por causa da exploração do petróleo.
E, apesar de haver dinheiro para relocalização dos seus habitantes, este não foi desbloqueado. E assim sofre uma tribo indígena sem voz. A exploração trouxe a ruína e são estes que pagam o preço.
Finalmente, Elizabeth Kolber fala-nos do estado da arte em relação à luta contra o aquecimento global, especificamente relacionado com a emissão de dióxido de carbono e as estratégias para a sua captura.
Uma fascinante visão da geo-engenharia, mas também uma triste conclusão: o princípio do fim já chegou. Chegará de forma desigual e injusta, mas inevitavelmente chegará a todos.
Os piores indicadores estão a ocorrer antes do previsto. Nada mais que um milagre - tecnológico, poderá reverter a situação.
No fim, ficamos com a sensação que todas as nossas acções individuais são fúteis e que as grandes "máquinas" de interesses irão acelerar a destruição.
Ainda ontem, em choque, lia sobre o facto da "energia verde" incluir biomassa que, por sua vez, é produzida com o abate de florestas.
Elizabeth Kolber arrasou-me e não vejo como ser optimista, a partir deste ponto.
Foi num artigo do Público, se a memória não me falha, que este Quarto de Despejo se tornou um objecto de desejo. Saiu da impressora em Abril de 2021 e está lido. É extraordinário que este livro, amplamente traduzido, só agora tenha chegado a Portugal, depois de uma tentativa frustrada em 1960, quando foi proibido por Salazar.
Quarto de Despejo é o diário de Carolina Maria de Jesus, que vive numa favela (Canindé) com os seus três filhos pequenos e abrange os anos de 1955-59.
O seu dia-a-dia era uma luta pela sobrevivência, passando os dias a recolher papel e ferro velho pelas ruas, o que mal dava para comer.
Aliás, a fome é o motor e a sensação dominante do seu diário. Este é, também um diário da fome.
E a fome domina também o seu papel de mãe: a luta diária é ter o que dar de comer aos seus filhos:
Como é horrível ver um filho comer e perguntar: "Tem mais? Esta palava "tem mais" fica oscilando dentro do cerebro de uma mãe que olha as panelas e não tem mais.
A sua filha (professora), haveria dizer que nunca conseguiu ler o livro da sua mãe de forma completa, tal é a emoção.
E com a fome, a revolta por um país desperdiçado por quem deveria governar as suas riquezas.
... Eu estou começando a perder o interesse pela existência. Começo a revoltar. E a minha revolta é justa.
(...) A democracia está perdendo os seus adeptos. No nosso paiz tudo está enfraquecendo. O dinheiro é fraco. A democracia é fraca e os políticos fraquissimos. E tudo que está fraco, morre um dia.
... Os políticos sabem que eu sou poetisa. E que o poeta enfrenta a morte quando vê o seu povo oprimido.
Carolina são todas as mulheres que se indignam pelos ataques à sua condição de mulher, são todas as mulheres negras que vivem diariamente o racismo, todas as mães que lutam por dar uma vida digna aos seus filhos, todas as cidadãs que se revoltam contra a corrupção e a iniquidade dos governantes.
É uma incrível e maravilhosa coincidência que tenha lido este Quarto de Despejo, no mesmo ano em que finalmente li A Room of One's Own de Virginia Wolf, o retrato de duas escritoras tão distinto quando distintas.
Mas como dizia Carolina Maria de Jesus:
na minha opinião escreve quem quer
E na minha opinião, todas/os a devem ler.
O livro perfeito para o #blackathon e para o #lerosclássicos2021 de Junho (clássico lusófono: publicado em 1960).
[Para aSusanita: É um livro único.]
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