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Hoje decidi ler o Mein Kampf de A. Hitler. Já me havia debatido muito com esta possibilidade, com pontos positivos e negativos, mas hoje foi a gota de água.
Este senhor, segundo as milhares de partilhas no Facebook é um terrorista que se fez passar por refugiado para se infiltrar na Europa. Como sabem disso? Fácil, basta olhar para ele. Está com arma, tem cara de muçulmado, é certamente um terrorista do ISIS.
Ups... afinal parece que ele foi entrevistado e identificado como sendo um comandante rebelde sírio, ex-estucador, que fugiu da fome e da morte como outros milhares de refugiados sírios.
Como deverão imaginar, a notícia que circula aos milhares não é a notícia verdadeira, mas a falsa.
É fácil dizer que todos os muçulmanos são terroristas. Mas é tão fácil como perigoso. É perigoso porque desumaniza milhões de pessoas. Não são pessoas, são muçulmanos, são eles. Se soubessem o quanto me tem assustado ouvir este eles tão frequentemente...
Eu não sou ingénua. Não sou ingénua a pensar que não haverá terroristas a entrar na Europa com refugiados. Mas também não sou ingénua ao ponto de pensar que eles não chegam cá sem a vaga de refugiados (pelo menos não têm tido problemas em actuar nos EUA). E menos ainda que só são terroristas os muçulmanos.
Acima de tudo não sou ingénua ao ponto de pensar que este eles diz muito mais de nós, do que as pessoas gostariam de pensar.
Um dia, eles foram judeus. Eles eram a raiz de todos os males, do crime à economia. Eles fugiram em vagas com nazis infiltrados. E nós juramos, do alto da nossa superior moralidade ocidental, que nunca deixaríamos que isso voltasse a acontecer.
Está a acontecer.
Claro que, a generalidade das pessoas não se identifica com a classificação de nazi ou de extrema direita. Na verdade, só estão a defender o seu país, a sua família contra eles. O problema é que esse era o discurso de Hitler. Mas as pessoas parecem querem manter-se na ilusão que o seu discurso não corresponde a algo que se habituaram a ver como o mal.
Os americanos têm uma expressão divertidíssima: if it talks like a duck, and walks like a duck, than it is a duck (que grasna como um pato e caminha como um pato, então é um pato. Se tens um discurso de extrema direita és de extrema direita.
Acredito na intrínseca bondade das pessoas. Acredito que é o medo que está a levar a esta falta humanidade e empatia para com seres humanos a morrer às centenas, aos milhares. Acredito, mas não sou ingénua ao ponto de achar que são todos boas pessoas com medo. Uma boa parte é simplesmente preguiçosa.
É fácil dizer não. É fácil dizer: vocês ficam aí a morrer desse lado, que eu tenho a minha vidinha para tratar.
O problema é que, quando recusamos a entrada na Europa de refugiados a estão a morrer à fome, a serem gaseados, isso diz muito mais da nossa humanidade que da deles.
Por isso, decidi ler o Mein Kampf. No mínimo, quando as boas pessoas começarem com o seu discurso, quero poder dizer-lhes, com toda a verdade, que Hitler concordaria com elas.
Durante o intervalo de almoço, é frequente ir passar o tempo na biblioteca mais próxima do meu local de trabalho. Costumava comer frente ao computador, mas não há nada como livros para me fazer levantar da cadeira. Se não for levantar ou entregar um livro, vou ler um conto.
Neste momento estou a ler os contos de Flannery O´Connor, na colectânea Gerânio. Almoço, faço uma caminhada, leio um conto e volto para o trabalho. Nada mau!
E por falar em livros lidos, que tal a própria Flannery O´Connor a ler A Good Man is Hard to Find?
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